Em entrevista à EXAME Invest, Alexandre Muller, gestor do fundo JGPX11, explica que os critérios socioambientais e de governança nortearam a escolha das nove empresas que estão na carteira do fundo
Regulamentados no ano passado, os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) já começam a povoar a bolsa brasileira. Um dos mais recentes ofertados é o JGPX11, fundo administrado pela JGP. Embora o número 11 indique que trata-se de um fundo imobiliário, o JGPX é, na verdade, um fundo de títulos de crédito de empresas do agro.
Para permitir que as primeiras ofertas do Fiagro fossem viabilizadas, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) determinou que, a princípio, os fundos do agro se enquadrassem na regra de três categorias já existentes: os Fundos de Investimento Imobiliário (FII), os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) e os Fundos de Investimento em Participações (FIP). As duas últimas, no entanto, só são acessadas por investidores qualificados.
"Para que pudéssemos fazer oferta para o público geral, enquadramos nosso fundo na classe de FIIs, mas é importante dizer que não temos ativos imobiliários na carteira, apenas títulos de crédito", explica Alexandre Muller, sócio da gestora JGP.
Os títulos em questão são FIDCs, debêntures e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) com lastro no agronegócio ou com emissão por nove empresas integrantes do setor. Entre as nove, estão gigantes como Syngenta, Cosan e Albaugh.
A preferência da composição da carteira com ativos de crédito se dá pela rápida maturação do fundo e pela possibilidade de distribuição de dividendos mais frequentes. Em dezembro, primeiro mês de negociação na bolsa, o JGPX11 pagou 1,04 real por cota, algo como 1%, considerando o preço da cota no final do mês.
"Neste momento de juros subindo, entendemos que a demanda dos investidores está concentrada em produtos de renda, que ofereçam a distribuição mensal de dividendos", afirma Muller.
Ele explica que essa demanda tem modulado as primeiras ofertas do Fiagro. Ao invés de fundos donos de propriedades agrícolas, que demandam um ciclo de investimento para a valorização, os títulos de crédito têm sido preferência dos gestores.
Curadoria
Para selecionar as 9 empresas da carteira, a JGP analisou 46 ativos diferentes. No processo de análise, Muller conta ter encontrado muitas "bolas quadradas"
"Embora seja um setor representativo no PIB, o agro ainda tem uma questão de formalização que é sensível. O fato de termos escolhidos poucas entre muitas empresas tem a ver com os critérios que adotamos: no nosso fundo, não temos investimento direto em produtores Pessoa Física, e exigimos balanço auditado para fazermos diligência e análise de crédito", conta o gestor.
É notória a baixa participação das empresas do agro no mercado financeiro. Até pouco tempo atrás, a bolsa brasileira contava com menos de uma dúzia de empresas do setor, entre mais de 400 negócios listados. Houve alguns avanços, mas não o suficiente para equiparar a representatividade do agronegócio à de outros segmentos. O IPO da Boa Safra, em abril de 2021, foi um dos últimos registrados.
No mercado de crédito, a diversidade é maior, em razão dos ativos criados especificamente para fomento do setor. Os CRAs, as Letras de Crédito do Agronegócio (LCA) e as próprias debêntures aumentaram o alcance do agro no mercado de capitais, embora a maior parte das empresas do segmento ainda se capitalize por meio do crédito bancário tradicional.
Segundo especialistas, o Fiagro tende a fomentar ainda mais a emissão desses títulos, dado que cria um canal importante de distribuição.
ESG no Fiagro
Outro aspecto importante que permeou a escolha dos ativos da carteira foram os critérios ambientais, sociais e governança (o chamado ESG, na sigla em inglês). O gestor da JGP explica que alguns dos 46 ativos foram excluídos com base nesses critérios.
"O agro está na linha de frente das demandas ambientais, das questões relacionadas ao desmatamento, do fim do trabalho em condições análogas à escravidão e do controle de uso de defensivos químicos. Analisamos se as empresas da nossa carteira têm capacidade de acompanhar o seu passivo ambiental de forma contínua, se fazem um monitoramento de cadeia de fornecedores e se há alguma multa anterior por práticas irregulares -- as que não passaram nessa análise, foram descartadas", conta Muller.
A razão para tal diligência é simples: se o gestor não faz o "pente fino" com base em critérios ESG, as instituições que se relacionam com a empresa e, em último caso, o próprio investidor o farão.
"Se não checarmos tudo antes, provavelmente quem vai identificar os problemas é a trade que compra grãos da empresa, ou o banco, que vai suspender a linha de crédito, ou até o comprador de produtos dessa companhia. Sabemos que esses fatores podem virar problemas sérios para, por exemplo, a exportação para outros países, o que afeta a receita, no final das contas", diz o gestor da JGP.
Reposicionamento de carteira
A primeira carteira do JGPX11 foi construída para ter um perfil mais defensivo. Embora historicamente cresça mais do que a média do PIB, o agronegócio brasileiro tem enfrentado problemas relacionados ao clima adverso e ao aumento de custos de produção. A escolha dos 9 ativos relacionados no fundo teve como base esse cenário mais desafiador.
No entanto, o sócio da JGP conta que a tendência é de mudança de estratégia, conforme o agro apresentar sinais de recuperação. O trabalho, agora, é selecionar mais dois ou três ativos para a composição da próxima carteira, entre 24 empresas que estão no pipeline da gestora.
"Neste momento, ao invés de aumentar o spread e tomar mais risco, é mais inteligente ser conservador e apostar na agilidade. Como temos 24 operações na fila de análise, acho que temos bom lago para escolher os peixes", explica Muller.
Entre os setores que podem ganhar protagonismo de forma direta ou indireta na carteira está o setor de café, cuja cotação está em alta no mundo todo, e o sucroalcooleiro, em razão da paridade de preços do etanol com a gasolina e da disparada do preço do açúcar no mercado externo.
Esteja sempre informado sobre as notícias que movem o mercado. Assine a EXAME por menos de R$ 11/mês.