Pop e diversidade em uma entidade com apenas um negro e cinco mulheres, mudança pode ser um frescor bem-vindo
Por Danilo Vicente*
Fernanda Montenegro e Gilberto Gil estão no panteão da cultura brasileira ? e, como deuses de suas artes, são eternos. Eis que ambos agora estão à véspera de entrar para a Academia Brasileira de Letras (ABL) e receberem oficialmente o título já conquistado, o de imortais, apelido dado aos 40 membros vitalícios da entidade.
Procurados por acadêmicos da centenária instituição guardiã da literatura e da língua nacionais, invertendo a lógica rotineira de bajulação por apoio a candidaturas, os dois, salvo algum acidente de percurso, serão os próximos a envergar o fardão da ABL, a vestimenta de gala da posse. Recentemente, anunciaram a entrega de cartas de suas candidaturas, o protocolo oficial para a corrida pela eleição.
Fernanda e Gil serão o fôlego pop da Academia, que passa por uma fase ruim e precisa de mídia positiva. A pandemia, e seu home-office, tirou a principal renda da ABL, o aluguel de imóveis no Rio de Janeiro, agravando má gestão histórica do dinheiro arrecadado. Também acumulou um buraco de 10% nas cadeiras dos acadêmicos. Hoje há quatro vagas, ocasionadas pelas mortes de Affonso Arinos de Mello Franco (março de 2020), Murilo Melo Filho (maio de 2020), Alfredo Bosi (abril de 2021) e Marco Maciel (junho de 2021).
Normalmente, após a vacância da cadeira, as candidaturas à eleição são pouco mais de dois meses. O passo inicial é a ?sessão da saudade?, homenagem na qual os imortais se despedem dos colegas que se foram. Não foi possível a reunião presencial por meses a fio. Até que, agora, em 5 de agosto, iniciou-se a solução: sessões virtuais.
A aclamação de Gil e Fernanda ainda pode ser vista como uma resposta da Academia às críticas pela falta de diversidade e representatividade negra (hoje, só há Domício Proença Filho entre os acadêmicos) e feminina (cinco cadeiras atualmente). O tema ficou em evidência depois da derrota da escritora mineira Conceição Evaristo em 2018. A Academia parece, às vezes, se esquecer que foi fundada pelo negro Monteiro Lobato.
Para ser membro da ABL é preciso muito mais do que um trabalho literário consistente. Mario Quintana que o diga. Após se candidatar três vezes, o poeta desistiu.
O modelo da ABL segue o da Academia francesa, que elege membros também por sua notoriedade em outras áreas da cultura, necessitando apenas ter um livro publicado e ser brasileiro. Por isso, já houve nomes como Ivo Pitanguy, cirurgião plástico, ou Roberto Campos, ex-ministro do Planejamento do governo de Castelo Branco.
Que bom que Fernanda e Gil devem entrar para este rol seleto. Que sejam o frescor tão bem-vindo à ABL.
*Danilo Vicente é sócio-diretor da Loures Comunicação
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
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